Em muitos momentos desses, pouco mais de um ano como mãe, eu questionei se as coisas deveriam ser do jeito que elas eram: as culpas, os sentimentos ruins e ansiedades. Eu nunca estava satisfeita com a maneira que minha maternidade caminhava, havia uma certa inadequação sempre presente. Então, eu me lembrei em algum momento que a maternidade nunca poderia ser algo totalmente confortável e pleno, já que ela também foi afetada pela queda. A beleza da maternidade estará manchada, gemendo com toda a criação até que Cristo redima tudo novamente (Rm. 8: 19 - 21).
O evangelho, no relato de Gênesis, nos diz que Deus criou todas as coisas (Col. 1: 16, 17) e elas eram boas, mas o pecado trouxe queda e separação. Ainda bem que não para por aí, pois o mesmo evangelho nos diz que há salvação e redenção disponíveis. Entre as muitas coisas que Deus criou, Ele nos fez dotadas da capacidade de sermos mães; nosso corpo e aparelho reprodutor são a maior prova disso. Aqui está um ponto interessante, porque o discurso em voga é outro, quando nos dizem repetidamente que ser mãe é algo que não é instintivo, mas aprendido. Nunca o sentimento de insegurança na maternidade rendeu tanto dinheiro como agora.
Deus nos fez, como mulheres, capazes de sermos mães, mas o pecado trouxe consequências. No relato da queda, após homem e mulher pecarem, Deus disse à mulher: "Multiplicarei grandemente o seu sofrimento na gravidez; com sofrimento você dará à luz filhos”. Para além das dores e intercorrências do parto, o pecado trouxe a nossa realidade infertilidades, depressões pós-parto, abortos espontâneos, problemas genéticos, síndromes, filhos rebeldes, entre outras dificuldades. Na tentativa insana de fugir da maldição que nos rodeia, a cultura a nossa volta se compromete, dia e noite, em redimir, por si só, a maternidade.
Não é à toa que temos tantas possibilidades disponíveis para ter um parto perfeito ou uma educação que levem nossos filhos a serem felizes e realizados materialmente. O livro maternidade Ressurreta (indico demais) fala sobre nossa tendência de nos enxergarmos como deusas desses processos, gastando nossas forças e dinheiro na tentativa de controlar algo que não podemos. Uma das autoras, falando sobre parto diz: “Nosso esforço se presta a redimir a experiência de parto, em vez de confiar no único e verdadeiro redentor”.
Nós, como cristãs, podemos e devemos obter informações que nos ajudem em nossa maternidade, mas nossa relação com tudo o que nos é apresentado, precisa ser diferente de pessoas que não acreditam no evangelho. As lentes pelas quais lemos artigos e posts do Instagram, a maneira como escutamos Podcasts e vídeos do Youtube, ou escolhemos livros, filmes e compramos jogos para nossos adolescentes, precisa ser diferente.
O maior erro que podemos cometer é achar que vivemos numa cultura neutra, que tudo o que se diz “científico” é aceitável, e tudo que nos ofereça controle e conforto em nossa maternidade ou felicidade e sucesso para nossa prole, deve ser abraçado. C.S. Lewis escreveu: “Não existe terreno neutro no universo: todo centímetro quadrado, toda fração de segundo é reivindicada por Deus e contra reivindicada por Satanás”, isso inclui a cultura da maternidade.
Vivemos numa era secularizada ao extremo, recebemos inúmeras informações, e mesmo conhecendo o evangelho, não filtramos o que tomamos por verdade, e nos vemos tantas vezes cheias de bandeiras e argumentos que se tornam novos compromissos do nosso coração.
Logo, nosso senso de valor começa a se basear no nosso desempenho como mães, que estão seguindo a última moda da rotina do sono e batendo meta no tummy time, ou tendo filhos matriculados no inglês com seus boletins acima da média, em vez de enxergar nosso valor como filhas amadas de um Deus gracioso.
A cosmovisão cristã nos diz que Deus criou o ser humano à sua imagem e semelhança, e que existem atributos comunicáveis do próprio Deus em sua criação. Logo, como cristãs, acreditamos que avanços na área da ciência e da medicina, bem como da tecnologia, são bênçãos; independentemente se foi um ateu ou um cristão que os encabeçou. Mas cremos também que nosso mundo caído rejeita continuamente o Autor da vida, e têm criado seus próprios deuses desesperadamente, e discursos que os justifiquem.
Em uma cultura que não acredita na criação, queda e redenção, a volta ao Éden por meios e esforços humanos é algo visto como possível. Para nosso mundo secular, nossos filhos nascem sem pecado, nossos corpos podem esperar muito para gerar, afinal, “os 50 são os novos 40”, podemos alavancar nossa carreira e sermos mães empoderadas e presentes ao mesmo tempo; o convite é ter tudo, somos humanas que podem virar deusas com superpoderes, “vai depender apenas de nossos esforços”, porque estamos em evolução constante. Numa cultura que tem como pano de fundo filosofias humanistas, ideologias, e a teoria da evolução, nós, como cristãs, precisamos repensarmos e sermos cautelosas sobre o que temos nos apegado com unhas e dentes nesse processo maternal.
A maternidade também é capaz de criar altares em nossas vidas; de repente tudo passa a girar em torno de algum assunto ou área que dominamos bem e parece nos dizer que somos boas mães ou vemos nossos filhos como pequenos deuses, que nos darão a felicidade que não obtivemos de outra maneira, bem como o amor que não recebemos de outro ser humano. Timoty Keller, em seu livro “Deuses Falsos”, nos alerta: “Tudo que nos controla é nosso Senhor” e que no relacionamento com nossos ídolos, “nós os amamos, confiamos neles e lhes obedecemos”.
As lentes do evangelho nos convidam a enxergar e interpretar o mundo a nossa volta. O ponto de partida é Deus em sua Criação e sua obra redentora, não nossas dores, traumas ou necessidades emocionais. Fomos convidadas a fazer parte dessa história, mas não somos suas autoras, quem diz o que vai ou não acontecer conosco e com nossos filhos é Deus em sua soberania. Podemos nos esforçar, aprender, tentar, mas nunca podemos achar que o sucesso de nossa maternidade depende de nossos esforços. As coisas escorrem por nossos dedos em um piscar de olhos, precisamos de algo mais seguro em que confiar, precisamos de um redentor.
Como mães cristãs, precisamos seguir o ensinamento do apóstolo Paulo, e não permitir que nossa mente e nossa família se amoldem ao padrão do mundo que vivemos, a ordem é: “transformem-se pela renovação da sua mente, para que sejam capazes de experimentar e comprovar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm. 12: 2). Só seremos capazes de discernir o que podemos ou não nos apegar em nossa maternidade, se estivemos buscando mais a Deus e Sua Palavra, do que conselhos na internet ou cursos que nosso dinheiro possa pagar. Deus é o criador da maternidade, só Ele pode nos direcionar nessa caminhada, não para que nossos filhos sejam felizes e bem-sucedidos, mas para que não percam suas almas tentando conquistar o mundo (Mc. 8: 36) nos tendo como exemplos, ainda por cima.
Lembremo-nos que estamos ajudando a construir a cosmovisão de nossos filhos, e temos a oportunidade de refinarmos a nossa, e darmos
a eles a oportunidade de enxergar e interpretar melhor o mundo que estão inseridos, através das lentes do evangelho (Pv. 21: 06).
Uma maternidade aos pés da cruz, debruçada sobre nossas bíblias, testemunhará aos nossos filhos tudo o que eles realmente precisam: um Salvador!
A Palavra de Deus torna-se os óculos que oferecem nova perspectiva sobre todos os nossos pensamentos e ações. Como ocorre com cada aspecto da santificação, a renovação da mente é dolorosa e difícil. Requer trabalho duro e disciplina, inspirado por um amor sacrificial a Cristo e um desejo ardente de edificar o seu Corpo, a Igreja. Para termos a mente de Cristo, devemos estar dispostos a sermos crucificados com Ele, indo aonde quer que nos conduza — a qualquer preço. [...] Desenvolver uma cosmovisão cristã significa submeter nosso "eu" a Deus, em ato de devoção e serviço a Ele.”
(Nancy Pearcey – Verdade Absoluta)
Que Texto, minhas amigas, que texto!
essa série sempre maravilhosa